sábado, 20 de dezembro de 2014

Procuradoria denuncia Ustra por morte de ativista na ditadura

Julia Affonso e Fausto Macedo

O Ministério Público Federal denunciou nesta sexta-feira, 19, três militares pela morte do militante político Hélcio Pereira Fortes, em janeiro de 1972. O coronel reformado Carlos Alberto Brilhante Ustra, o delegado Dirceu Gravina e o delegado aposentado Aparecido Laertes Calandra são acusados por homicídio doloso qualificado.
A Procuradoria quer ainda que os três tenham a pena aumentada por causa de agravantes, como motivo torpe para a morte, emprego de tortura e abuso de poder. O ativista era ligado ao PCB e dirigente da Ação Libertadora Nacional. Ele foi morto aos 24 anos após ser torturado no Destacamento de Operações de Informações do antigo II Exército (DOI), em São Paulo.
"Os delitos foram cometidos em contexto de ataque sistemático e generalizado à população, em razão da ditadura militar brasileira, com pleno conhecimento desse ataque, o que os qualifica como crimes contra a humanidade - e, portanto, imprescritíveis e impassíveis de anistia", afirma o procurador da República Anderson Vagner Gois dos Santos, responsável pela denúncia.
Fortes foi sequestrado em 22 de janeiro de 1972 por agentes da repressão no Rio de Janeiro e levado para a sede do DOI na capital fluminense. Alguns dias depois, foi transferido para o DOI em São Paulo. Lá, Ustra, na época o major que comandava a unidade, Gravina e Calandra, seus subordinados, submeteram o militante à tortura e a maus tratos, segundo a denúncia.
O MPF sustenta que a versão oficial de Ustra afirma que a morte de Hélcio teria ocorrido às 10h do dia 28 de janeiro. No entanto, conforme relato da testemunha Darci Toshiko Miyaki, militante da ALN que também esteve presa no DOI na mesma época, ela e Hélcio foram conduzidos a São Paulo por agentes da repressão no dia. Eles teriam chegado ao DOI por volta das 16h.
Darci afirma ainda que estava em uma sala ao lado da de Hélcio e ouviu os grito do ativista, nos momentos em que as torturas eram interrompidas. De acordo com ela, em um dos intervalos, um dos agentes disse que Hélcio estava sendo empalado. A testemunha acredita que ele tenha morrido no dia 30 ou 31 de janeiro.
Morte
Para a Procuradoria, Ustra planejou e executou a "versão oficial" de que a vítima teria fugido da prisão e falecido em decorrência de tiroteio com agentes de segurança. A explicação está no atestado de óbito e no laudo do exame de corpo de delito de Hélcio.
O ativista foi enterrado no Cemitério Dom Bosco, no bairro de Perus, em São Paulo, sem a presença dos parentes. A família conseguiu levar os restos mortais de Hélcio para Ouro Preto, cidade natal do militante, três anos depois, em 1975. Segundo o MPF, a ocultação do cadáver tinha como objetivo esconder a verdadeira causa da morte, pois, após enterrado, dificilmente o corpo seria localizado e, assim, não seria possível constatar a existência de marcas da tortura.
O coronel Ustra tem negado reiteradamente uso de métodos de tortura nas dependências do DOI-CODI. Os outros dois acusados, Gravina e Calandra, também negam prática de tortura.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Comissão reconhece 434 mortes e desaparecimentos durante ditadura militar

  • 10/12/2014 11h03
  • Brasília
Michèlle Canes - Repórter da Agência Brasil Edição: Graça Adjuto
Brasília - Tumulto e confusão marcaram sessão da Câmara do Deputados sobre 50 anos do golpe militar de 1964 (Antonio Cruz/Agência Brasil)
CNV confirma em relatório mais de 200 desaparecidos políticos durante a ditadura militarAntonio Cruz/ Agência Brasil
Depois de dois anos e sete meses de trabalho, a Comissão Nacional da Verdade (CNV) confirmou, em seu relatório final, 434 mortes e desaparecimentos de vítimas da ditadura militar no país. Entre essas pessoas, 210 são desaparecidas.
No documento entregue hoje (10) à presidenta Dilma Rousseff, com o relato das atividades e a conclusão dos trabalhos realizados, a CNV traz a comprovação da ocorrência de graves violações de direitos humanos. “Essa comprovação decorreu da apuração dos fatos que se encontram detalhadamente descritos no relatório, nos quais está perfeitamente configurada a prática sistemática de detenções ilegais e arbitrárias e de tortura, assim como o cometimento de execuções, desaparecimentos forçados e ocultação de cadáveres por agentes do Estado brasileiro” diz o texto.
Mais de 300 pessoas, entre militares, agentes do Estado e até mesmo ex-presidentes da República, foram responsabilizadas por essas ações ocorridas no período que compreendeu a investigação. O documento diz ainda que as violações registradas e comprovadas pela CNV foram resultantes “de ação generalizada e sistemática do Estado brasileiro” e que a repressão ocorrida durante a ditadura foi usada como política de Estado “concebida e implementada a partir de decisões emanadas da Presidência da República e dos ministérios militares”.
Outro ponto de destaque das conclusões do relatório é que muitas das violações comprovadas durante o período de investigação ainda ocorrem nos dias atuais, apesar da existência de um contexto político diferente. Segundo o texto, “a prática de detenções ilegais e arbitrárias, tortura, execuções, desaparecimentos forçados e mesmo de ocultação de cadáveres não é estranha à realidade brasileira contemporânea” e crescem os números de denúncias de casos de tortura.
Diante dessas conclusões, o relatório final da CNV traz 29 recomendações, divididas em três grupos: medidas institucionais, iniciativas de reformulação normativa e de seguimento das ações e recomendações dadas pela comissão.
>> Confira o especial 1964: Democracia Interrompida
Entre as recomendações estão, por exemplo, questões como a determinação da responsabilidade jurídica dos agentes públicos envolvidos nessas ações, afastando a aplicação da Lei da Anistia (Lei 6.683/1979) por considerar que essa atitude “seria incompatível com o direito brasileiro e a ordem jurídica internacional, pois tais ilícitos, dadas a escala e a sistematicidade com que foram cometidos, constituem crimes contra a humanidade, imprescritíveis e não passíveis de anistia”.
A CNV recomenda também, entre outros pontos, a desvinculação dos institutos médico-legais e órgãos de perícia criminal das secretarias de Segurança Pública e das polícias civis, a eliminação do auto de resistência à prisão e o estabelecimento de um órgão permanente para dar seguimento às ações e recomendações feitas pela CNV.
Em suas mais de 3 mil páginas, o documento traz ainda informações sobre os órgãos e procedimentos de repressão política, além de conexões internacionais, como a Operação Condor e casos considerados emblemáticos como a Guerrilha do Araguaia e o assassinato da estilista Zuzu Angel, entre outros. O volume 2 do documento traz informações sobre violações cometidas contra camponeses e indígenas durante a ditadura.
A Comissão Nacional da Verdade foi instalada em 2012. Criada pela Lei 12.528/2011, a CNV será extinta no dia 16 de dezembro.

Comissão reconhece 434 mortes e desaparecimentos durante ditadura militar

  • 10/12/2014 11h04
  • 10/12/2014 11h03
  • Brasília
Michèlle Canes - Repórter da Agência Brasil Edição: Graça Adjuto
Brasília - Tumulto e confusão marcaram sessão da Câmara do Deputados sobre 50 anos do golpe militar de 1964 (Antonio Cruz/Agência Brasil)
CNV confirma em relatório mais de 200 desaparecidos políticos durante a ditadura militarAntonio Cruz/ Agência Brasil
Depois de dois anos e sete meses de trabalho, a Comissão Nacional da Verdade (CNV) confirmou, em seu relatório final, 434 mortes e desaparecimentos de vítimas da ditadura militar no país. Entre essas pessoas, 210 são desaparecidas.
No documento entregue hoje (10) à presidenta Dilma Rousseff, com o relato das atividades e a conclusão dos trabalhos realizados, a CNV traz a comprovação da ocorrência de graves violações de direitos humanos. “Essa comprovação decorreu da apuração dos fatos que se encontram detalhadamente descritos no relatório, nos quais está perfeitamente configurada a prática sistemática de detenções ilegais e arbitrárias e de tortura, assim como o cometimento de execuções, desaparecimentos forçados e ocultação de cadáveres por agentes do Estado brasileiro” diz o texto.
Mais de 300 pessoas, entre militares, agentes do Estado e até mesmo ex-presidentes da República, foram responsabilizadas por essas ações ocorridas no período que compreendeu a investigação. O documento diz ainda que as violações registradas e comprovadas pela CNV foram resultantes “de ação generalizada e sistemática do Estado brasileiro” e que a repressão ocorrida durante a ditadura foi usada como política de Estado “concebida e implementada a partir de decisões emanadas da Presidência da República e dos ministérios militares”.
Outro ponto de destaque das conclusões do relatório é que muitas das violações comprovadas durante o período de investigação ainda ocorrem nos dias atuais, apesar da existência de um contexto político diferente. Segundo o texto, “a prática de detenções ilegais e arbitrárias, tortura, execuções, desaparecimentos forçados e mesmo de ocultação de cadáveres não é estranha à realidade brasileira contemporânea” e crescem os números de denúncias de casos de tortura.
Diante dessas conclusões, o relatório final da CNV traz 29 recomendações, divididas em três grupos: medidas institucionais, iniciativas de reformulação normativa e de seguimento das ações e recomendações dadas pela comissão.
>> Confira o especial 1964: Democracia Interrompida
Entre as recomendações estão, por exemplo, questões como a determinação da responsabilidade jurídica dos agentes públicos envolvidos nessas ações, afastando a aplicação da Lei da Anistia (Lei 6.683/1979) por considerar que essa atitude “seria incompatível com o direito brasileiro e a ordem jurídica internacional, pois tais ilícitos, dadas a escala e a sistematicidade com que foram cometidos, constituem crimes contra a humanidade, imprescritíveis e não passíveis de anistia”.
A CNV recomenda também, entre outros pontos, a desvinculação dos institutos médico-legais e órgãos de perícia criminal das secretarias de Segurança Pública e das polícias civis, a eliminação do auto de resistência à prisão e o estabelecimento de um órgão permanente para dar seguimento às ações e recomendações feitas pela CNV.
Em suas mais de 3 mil páginas, o documento traz ainda informações sobre os órgãos e procedimentos de repressão política, além de conexões internacionais, como a Operação Condor e casos considerados emblemáticos como a Guerrilha do Araguaia e o assassinato da estilista Zuzu Angel, entre outros. O volume 2 do documento traz informações sobre violações cometidas contra camponeses e indígenas durante a ditadura.
A Comissão Nacional da Verdade foi instalada em 2012. Criada pela Lei 12.528/2011, a CNV será extinta no dia 16 de dezembro.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Relatório final da CNV terá 300 nomes de agentes responsáveis por torturas

Agência Brasil
Integrante da Comissão Nacional da Verdade (CNV), o ex-ministro da Justiça José Carlos Dias disse nesta segunda-feira (8), em São Paulo, que o relatório final da comissão, que será divulgado quarta-feira (10), terá nomes de mais de 300 militares, agentes de Estado e até mesmo ex-presidentes da República. Acrescentou que o documento recomendará que eles sejam punidos pelos crimes de tortura, execuções e ocultação de cadáveres.
“Não podemos pedir a punição, porque esta não é nossa missão ou função. Estamos proclamando que, pelos caminhos do Poder Judiciário ou do Poder Legislativo, a questão da anistia seja enfrentada de forma corajosa, porque os crimes contra a humanidade são imprescritíveis e não sujeitos à Lei da Anistia”, salientou Dias, antes de participar, na tarde de hoje, da cerimônia de inauguração de um monumento aos mortos e desaparecidos políticos no Parque Ibirapuera, em São Paulo.
Segundo ele, o relatório não pedirá a revisão da Lei da Anistia. “Não vai pedir a revisão, mas pedirá que a anistia não seja reconhecida para agentes de Estado que praticaram violações aos direitos humanos”, ressaltou o ex-ministro.
Também presente ao evento na capital paulista, a ministra Ideli Salvatti, da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, disse esperar que o relatório final da CNV provoque alteração na Lei da Anistia, permitindo que os agentes responsáveis por torturas, mortes e desaparecimentos durante a ditadura militar sejam punidos por esses crimes.
“Temos a Lei da Anistia [em vigor no país], mas o próprio Judiciário debate a interpretação da Lei da Anistia. O Brasil é signatário de acordos internacionais prevendo crimes imprescritíveis e que não perdem sua validade. O relatório da Comissão Nacional da Verdade poderá ensejar aprofundamento desse debate jurídico. No Congresso Nacional existem propostas de alteração da legislação em vigor. Portanto, acredito que, com o relatório, teremos continuidade do debate para que a justiça seja feita”, comentou a ministra. 
 
Tags: comissão, ditadura, MILITAR, nacional, verdade

terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Justiça muda decisão e pode punir agentes por crimes da ditadura


A Justiça Federal de São Paulo reverteu nesta segunda (1º) decisão da primeira instância e vai julgar o coronel reformado do Exército Carlos Alberto Brilhante Ustra, 81, pelo crime de ocultação de cadáver de um militante morto na ditadura (1964-1985).
É a primeira vez que a segunda instância da Justiça brasileira reverte uma decisão desconsiderando os efeitos da Lei da Anistia para permitir o julgamento de um acuso de crimes na ditadura.
Ustra e o delegado aposentado Alcides Singillo foram denunciados pelo Ministério Público Federal sob a acusação de ocultar o corpo de Hirohaki Torigoe, 27, assassinado pela repressão política, em São Paulo, em janeiro de 1972.
Na denúncia, a Procuradoria sustentava que Torigoe foi levado vivo para o DOI-Codi, centro do Exército que Ustra dirigiu. Lá, teria sido morto após sessão de tortura.
Os procuradores afirmavam que o crime era permanente e que os acusados não poderiam ser beneficiados pela Lei da Anistia, já que o cadáver de Torigoe não foi localizado até hoje –o que é considerado um crime permanente.
Na versão divulgada pelas Forças Armadas, o guerrilheiro morreu durante tiroteio, ao resistir à prisão. Ele foi enterrado com um nome falso.
Em janeiro deste ano, a primeira instância da Justiça Federal de São Paulo considerou prescrito o crime de ocultação de cadáver atribuído aos dois agentes da ditadura.
O Ministério Público Federal recorreu da decisão, alegando que ocultação de cadáver era um delito permanente, portanto imprescritível, e o caso foi julgado nesta segunda pela 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região. Por 2 votos a 1, decidiu-se com base em tratados internacionais –dos quais o Brasil é signatário– que Ustra e Singillo deverão ser julgados pela 5ª Vara Criminal de São Paulo.
O coronel reformado Carlos Alberto Brilhante Ustra e o delegado aposentado Alcides Singillo não foram localizados pela reportagem nesta terça-feira (2).